"MAIOR É O QUE ESTÁ EM VÓS DO QUE O QUE ESTÁ NO MUNDO." (I JOÃO 4:4)

terça-feira, junho 14, 2011

O VERDADEIRO REVERENCIAR - parte 1


Masaharu Taniguchi


Certo dia, ao chegar ao salão de conferências, reparei em dois membros da Seicho-no-ie, a sra. Yassukawa e o sr. Kinjiro Sato, que reverenciavam respeitosamente cada pessoa que chegava ou saía. A imagem daqueles dois, que cumprimentavam e reverenciavam com profundo respeito a todas as pessoas, é o reflexo da imagem do próprio Buda.

Nem o sr. Sato nem a sra. Yassukawa estavam procedendo daquele modo motivados por algum interesse particular. Eles não estavam lá para zelar pela ordem do recinto e receber recompensa por isso. Eu vi refletida a image de Buda nas figuras daqueles dois que reverenciavam os outros, sem nada esperar em troca.

Reverenciar com a mente livre de qualquer interesse ou apego - essa é a atitude que reflete a imagem do próprio Buda.

Ainda ontem, estive lendo um livro da seita Zen, em que consta a seguinte história: Havia outrora na China um imperador chamado Sen-Soo, que se dedicou ao estudo da doutrina budista desde a infância. No princípio, ele estudou como grande sacerdote Kyogen, e posteriormente com o sumo-sacerdote Sai-An, época em que teve como colega o mestre Oo-Baku, que era o líder dos discípulos e que, mais tarde, fundou a escola Oo-Baku, do Zen-Budismo.

Pois bem: Certo dia, encontrando o colega Oo-Baku a orar fervorosamente diante da imagem de Buda, Sen-Soo (que, na época, ainda não era imperador) fez-lhe a seguinte pergunta: "Por que o senhor está orando a Buda, se, na sutra Vimalakirti está escrito que não devemos buscar, com apego, nem Buda, nem a Verdade, nem a salvação dos homens?" De fato, na sutra Vimalakirti consta que o homem não deve apegar-se ao desejo de alcançar o estado búdico e buscar isso com ansiedade; não deve apegar-se ao desejo de apreender a Verdade buscá-la ansiosamente; e nem mesmo deve apegar-se ao desejo de salvar as pessoas. Respondendo à pergunta de Sen-Soo, Oo-Baku disse: "Não estou buscando, com apego, nem Buda, nem a Verdade, nem a salvação dos homens. Estou, pura e simplesmente, reverenciando Buda". Portanto, aquela era a verdadeira oração, sem intenções nem apego.

Orando com total desprendimento, o homem se identifica com Buda. O que está escrito na sutra Vimalakirti significa o seguinte: É inútil o homem empenhar-se na busca da Verdade visando tornar-se um grande sábio; é inútil buscar Buda, visando igualar-se a ele; e é também inútil orar pela salvação de alguém, se essa oração é feita com a mente em apego. É muito comum as pessoas pensarem: "Quero que meu filho doente seja curado. Ouvi dizer que, orando à divindade "X", consegue-se a cura. Vou orar a ele todos os dias". Será inútil orar com essa atitude mental. Quando o filho adoece gravemente, algumas mães pensam: "Na Seicho-no-ie, ensinam que basta o casal restabelecer a harmonia conjugal para que os filhos recuperem a saúde. Portanto, vou procurar reverenciar meu marido". Essa não é a atitude mental correta, visto que se baseia no apego em relação ao filho. Podem haver casos em que se consegue a cura mesm partindo dessa atitude mental, como se verifica pelos fatos vivenciados por algumas pessoas, mas isso não é fé verdadeira. Mesmo assim, isto é, mesmo que a esposa procure harmonizar-se com o marido somente com o objetivo de curar o filho, tal atitude mental é melhor do que a de guarda rancor contra o marido. Porém, orar com aquela atitude mental denota interesse próprio, porque a pessoa se dirige a Deus movida pelo apego a alguém ou algo. Orar assim é como fazer uma trasação comercial. Se alguém pensa: "Orando, conseguirei benefícios", esse é um pensamento interesseiro, mercantilista. Não é a fé sincera e verdadeira. A verdadeira fé é aquela em que a pessoa nada pede a Deus, nada exige dEle. Por ter consciência disso é que Oo-Baku disse: "Não estou buscando, com apego, nem Buda, nem a Verdade, nem a salvação dos homens. Estou, pura e simplesmene, reverenciando Buda".

Consta que esse mestre Oo-Baku era um homem de quase dois metros de altura e muito energético para com seus discípulos. Tanto que, certa vez, deu uma bofetada em Rinzai, que mais tarde tornou-se mestre e fundou a escola Rinzai. O episódio se deu no tempo em que Rinzai era discípulo do mestre Oo-Baku. Estando já há cerca de três anos a dedicar-se ao estudo do Zen sob a orientaçãodo mestre Oo-Baku, e mesmo assim não tendo compreendido a essência dos ensinamentos, pensou: "Não posso ficar aqui, passando os dias em vão, indefinidamente. Mas o que devo fazer?" Resolveu então falar com o mestre Oo-Baku e perguntou: "Onde encontrarei Buda?" Sem nada dizer, o mestre deu-lhe uma bofetada.

Imaginem o que aconteceria se, nos dias atuais, um mestre religioso - por exemplo, um preletor da Seicho-no-ie - desse uma bofetada num adepto. Criar-se-ia um grande problema, é claro. Aliás, os mestres do Zen costumavam trazer na mão uma espécie de régua cumprida ou uma bengala, e usavam-nas para corrigir as posturas erradas dos discípulos durante a sessão de meditação ou, às vezes, quando um discípulo custava enteder os ensinamentos. Mesmo quando alguém procurava um mestre famoso para pedir-lhe que o aceitasse como discípulo, dificilmente era atendido. Quase sempre, o candidato era recusado. Mas muitas pessoas, por mais que fossem rejeitadas, insistiam em pedir para que fossem aceitas como discípulos. Hoje em dia, é diferente. Não há pessoas que buscam com tanto fervor o aperfeiçoamento espiritual. Se as igrejas fossem tão rigorosas e exigentes com aqueles que as procuram para encontrar o caminho da Verdade, eles logo desistiriam. Potanto, na Seicho-no-ie, não há professores "bravos" como o mestre Oo-Baku. Aquele que não trata os outros com bondade e paciência não consegue exercer bem a função de preletor da Seicho-no-ie. Os preletores da Seicho-no-ie jamais devem assumir ares de superioridade, como quem diz: "Sou eu quem oriento vocês". Devem ser humildes, e agradecer a Deus a oportunidade de transmitir os ensinamentos aos que vêm em busca da Verdade.

Mas voltemos ao caso acima narrado, e vamos refletir por que o mestre Oo-Baku esbofeteou o discípulo Rinzai. Essa análise é muito interessante.

Rinzai perguntara ao mestre: "Onde encontrarei Buda?" A mente ansiosa por encontrar Buda - esta é uma forma de apego. Era preciso que Rinzai abandonasse a ânsia de encontrar Buda. Era preciso, também, que ele compreendesse que, se ele está vivo, é porque Buda está vivo, aqui e agora. O mestre Oo-Baku, vendo a ansiedade de Rinzai e percebendo que ele se perdera na busca de Buda, pensou: "Esse tolo ainda não compreendeu que Buda está vivo, aqui e agora, junto de cada um de nós, e vive a buscá-lo aqui e acolá. Vou dar-lhe um bofetada, para que consiga despertar". Assim, o mestre esbofeteou o discípulo Rinzai para destruir a ilusão que o impedia de compreender a Verdade. E mesmo tendo sido esbofeteado, Rinzai voltou a perguntar: "Onde encontrarei Buda?", e o mestre tornou a esbofeteá-lo. Ainda assim, Rinzai perguntou pela terceira vez: "Onde encontrarei Buda?", e pela terceira vez o mestre o esbofeteou. Finalmente, o teimoso Rinzai desistiu. Ele pensou "Ficando aqui, só recebo bofetadas" e fugiu dali, indo procurar o monge Taigu, a quem contou o que lhe tinha acontecido. Então o monge Taigu disse: "Como é bondoso o seu mestre Oo-Baku! Volte para junto dele e torne a ser discípulo dele". Foi então que Rinzai compreendeu o propósito de seu mestre; voltou para junto dele, e finalmente alcançou o despertar.

Assim era o mestre Oo-Baku. Foi um grande homem; foi um homem arrojado. Não porque tinha quase dois metros de altura, nem porque esbofeteava os discípulos. Sua grandiosidade e arrojo está no fato de ele ter realmente "assimilado" Buda. Pessoas que sabem realmente quem é Buda e onde ele se encontra - essas é que são grandiosas e arrojadas. Mas a maioria das pessoas não sabe realmente onde se encontra Buda, e por isso vive a procurá-lo, a buscar a Verdade, a liberdade e todas as demais bênçãos de Buda. A partir do momento em que compreender realmente onde se encontra Buda, deixará de buscá-lo no mundo exterior.
Cont...

("A Verdade da Vida, vol. 12", pgs. 163-168)






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